Friday, September 28, 2007

Alma Imoral

Na peça Alma Imoral, Clarice Niskier interpreta ela mesma em uma resposta as suas escolhas filosóficas. Baseada no texto do rabino Nilton Bonder, o espetáculo pode ser resumido com uma frase: não há tradição sem traição.

Mais que isso, também não há traição sem tradição. Na disputa entre o certo e o errado, percebemos que não existe nem um nem outro. Toda evolução que gerou o estado atual partiu de rompimentos com as realidades anteriormente impostas. De forma que a única tradição possível é a ausência desta, uma constante mudança.

Na mesma linha, é possível analisar o significado de fidelidade. Nem sempre a traição é infidelidade e, muitas vezes, ao sermos fiéis, estamos traindo aqueles com quem nos relacionamos - impedindo as mudanças. Na medida que toda infidelidade se baseia em contratos, são justamente esses contratos que precisam ser constantemente revistos para refletir a nova realidade em mutação. Também, a própria lei é um privilégio a determinado ponto de vista, que deve, de tempos em tempos, ser revista.

A paz é mais que somente a ausência de guerras. A estabilidade é mais que a ausência de mudanças. A paz e a estabilidade, tão necessárias, são muitas vezes o verdadeiro entrave para a verdade. Ou não.

Carpe Diem,

Wednesday, September 26, 2007

Desapego

Na peça "Homens são de marte... e é prá lá que eu vou!", com Mônica Martelli, a protagonista passa um tempo em Caraiva, onde aprende a técnica do desapego. Nada muito misteriosa, a técnica consiste, simplesmente, em se libertar de vínculos exagerados com bens materiais. Ao perder seu óculos da moda, Fernanda percebe quão difícil é se desapegar das coisas.

Em viagem, certo amigo perdeu uma câmera fotográfica com diversas fotos já tiradas. Se lembrou de um ditado budista - algo como: "deixa ir o que tem que ir". Descansou com a perda e, sentindo-se melhor, seguiu viagem. Uma boa alma devolveu-lhe a máquina em seu hotel e ele recuperou as fotos.

De fato, não é tão simples assim ter seus bens perdidos de volta - não basta se desapegar. Entretanto, dado que já os perdemos, a atitude mais feliz para praticar é "deixar ir". Não encontrando o que perdemos, ficamos bem. Encontrando, melhor ainda. Tal técnica também nos ajuda a agir melhor com pessoas: amigos e amores.

Na verdade, nada ou ninguém é de ninguém. Como diria Paulinho da Viola em Meu Mundo É Hoje: Pois sei que além de flores, nada mais vai no caixão.

Carpe Diem,

Wednesday, September 19, 2007

Línguas

As vezes nos perguntamos como se dão as evoluções lingüísticas. Por exemplo, por que em inglês o futuro é construído com o auxiliar "will" e no português existe um tempo verbal próprio?

Uma resposta é a origem do tempo futuro em português. Nessa língua, o futuro do presente e o futuro do pretérito são formados pela aglutinação do infinitivo do verbo com as formas reduzidas do verbo haver (no presente e no imperfeito do indicativo). Assim, amarei vem de amar + hei, e amaria vem de amar + hia (por havia). Com isso, tudo parece fazer mais nexo. A diferença primordial é que, em português (e em espanhol) houve essa aglutinação - talvez até devido ao auxiliar estar posposto ao verbo principal - enquanto em inglês permaneceu a construção antiga.

Essas diferenças nos ajudam a perceber o caráter evolutivo das línguas e como, no geral, elas começam bastante similares. Por razões culturais (por exemplo, um povo pode ter mais preferência pela aglutinação que o outro) ou conseqüências de uma escolha distinta (escolher, por exemplo, colocar o auxiliar antes ou após o verbo) as línguas tomam rumos totalmente distintos.

Dada a evolução constante das formas de comunicação, algumas escolhas subjetivas (como usar somente a palavra "dedo" em português e "finger / toe" em inglês), no longo prazo, podem tornar as semelhanças de hoje em algo totalmente distinto no futuro. Daí a importância da história.

Carpe Diem,

Monday, September 17, 2007

Motivação

Comida! Essa era a grande motivação para os milhões de trabalhadores expulsos dos campos, no século XVIII, para a nascente indústria européia. E hoje, como motivar?

É o sentimento de fazer parte de um todo maior o que aumenta o desempenho da maioria das pessoas. Você não é somente mais um, diria um gerente, você está trabalhando para o crescimento da empresa; e tudo que somos hoje se deve a sua colaboração. Chegaram a dizer algo semelhante até para faxineiros e copeiros. Um exagero! Mesmo sabendo que todos têm, certamente, uma função útil.

A conquista da criatividade e dedicação da maioria dos empregados ruiu com o fim da estabilidade. Quando um discurso de valorização de mão-de-obra, alguns meses depois, gera uma demissão em massa, tudo fica vago e difuso. E o trabalhador, buscando o mínimo de segurança, passa a se qualificar não para atender necessidades de seu empregador, mas para facilitar sua absorção pelo concorrente. Como estimular, agora, esse novo tipo de ser humano?

Você é sócio! Dizem, atualmente, os gerentes: tudo que você contribuir para nosso negócio, depois que nos proporcionar crescimento e maior fluxo de caixa, será revertido, também, para seu bolso. Pronto! Resolvemos o problema da motivação. Dizem até que a secretária do início da Microsoft é, hoje em dia, milionária. Obviamente, muito ela ralou para tornar realidade a gigante do software mundial - sendo bem recompensada por isso.

O que chama a atenção, porém, é a grande quantidade de sócios que o são somente no papel. Não têm, nunca tiveram ou mesmo terão, qualquer vantagem por isso. Talvez, até, trabalhem significativamente mais do que a maioria que não usufrui de tal prerrogativa. Como, estatisticamente, poucos são os casos de sucesso em um mar de fracassos, faz-se necessário a real análise dos fatos. A motivação deve estar bem fundamentada para proporcionar, a longo prazo, um trabalho criativo e eficaz, além de guiar no caminho para o sucesso. Só atenção com o trabalho exclusivamente em troca de comida!

Carpe Diem,

Friday, September 14, 2007

Renan e a Justiça

O caso Renan Calheiros anda revoltando a sociedade brasileira. Como será que o Senado teve a audácia de absolvê-lo depois de tamanha seqüência de escandalos? Como ignorou excelsa quantidade de provas, documentos e depoimentos que o condenavam? Como foi capaz de calar a boca da população brasileira e da mídia que clamavam por justiça?

Na verdade, não houve escandalo! Tudo foi criado, principalmente pela mídia. E a população, como sempre, foi atrás. Isso não é uma defesa de Renan, mas uma constatação do estado de direito em que vivemos. Por exemplo: é negado a qualquer pessoa desobedecer a constituição, mesmo que considere a lei inconstitucional. Isso porque, se cada um tiver o direito de julgar se uma norma está correta ou não, e obedecê-la segundo sua vontade, o estado entre em caos. Daí a função exclusiva do STF de julgar o que é ou não constitucional.

Se a mídia, em sua atribuição democrática de fornecer informação, encontra evidências de corrupção, é louvável que tudo seja informado ao cidadão. Isso ocorreu incessantemente nos últimos meses, quando, semana após semana, novos fatos eram noticiados. A questão principal é: tais fatos provam a culpa? Certamente não, já que não é a imprensa, e nem sequer a população, quem tem o direito de julgar! No caso Renan, era justamente o Senado quem tinha esse direito legal: absolver ou condenar. Como o orgão responsável relevou de culpa o senador, nos cabe aceitar tal decisão. Ou lutar, democraticamente, para alterar o processo de julgamento. Ou levar, pelo meios cabíveis, as supostas provas para o Poder Judiciário e policial, e conseguir abertura de processo criminal contra o senador.

O principal problema, neste caso, advém da falta de confiança do povo brasileiro em seu corpo político. De forma que, ao menor sinal de corrupção, os envolvidos são automaticamente considerados, por todos, como culpados. Onde foi parar o direito de presunção da inocência em nosso país?

Carpe Diem,

Thursday, September 13, 2007

Guerra

A história da Europa é marcada profundamente por disputas internas. Guerras e mais guerras assolaram o continente que dominava o mundo até o século XIX. Certamente o domínio se estenderia até os dias de hoje se, ao invés de gladiarem entre si, os europeus tivessem se mantido unidos.

Esse mesmo fato vem se repetindo na história. As cidades gregas, mesmo podendo expandir seus território, permaneciam em disputas entre elas. Idem para Japoneses e Chineses. Essa aparente contradição é reflexo de como os governos vêem o mundo e a natureza humana.

Na visão idealista, o homem é considerado naturalmente bom, e existe a noção de uma comunidade internacional governada pela Justiça. Outro ponto de vista, o realista, é cético quanto as qualidades morais do ser humano. O conflito, aqui, é visto como latente, derivando a necessidade de proteção constante contra agressões: impera o conceito de segurança.

A Balança de Poder (equilíbrio de poder) que determinou a política européia pós Napoleão, é um exemplo prático da visão realista. Foi essa visão que levou o mundo as grandes guerras do século XX e à busca da construção de uma comunidade internacional via ONU.

O medo do vizinho impede alianças que seriam benéficas para todas as partes. Como na Teoria dos Jogos, no exemplo dos dois prisioneiros (se um entrega o outro, sai livre e o outro pega pena máxima; se os dois se entregam, pegam pena média; se ninguém é entregue, ambos saem livres), os estados cismam em apostar na traição do vizinho e agem de forma a se proteger. Essa proteção, mais cedo ou mais tarde, leva à guerra.

A evolução das Organizações Internacionais são um passo na formação de uma comunidade internacional segura. Parece, de tempos em tempos, que na ausência de uma Entidade central de proteção (um Leviatã) as nações, assim como seus habitantes, são incapazes de um convívio fraterno.

Carpe Diem,

Wednesday, September 12, 2007

O (Des) Emprego

Pode-se dividir as escolas econômicas em duas: clássicas e keynesianas. A primeira prega um estado minimalista enquanto a segunda aposta no poder da intervenção estatal. Por trás dessas correntes existe um detalhe crucial: o desemprego.

Os clássicos idolatram o mercado: em liberdade, os agentes econômicos são plenamente capazes de chegar a um equilíbrio ótimo. Ocorre o famoso encontro entre oferta e demanda onde, coeteris paribus (outras variáveis constantes), um aumento na oferta, com a mesma demanda, gera um redução dos preços; e vice-versa. Para essa escola, quanto menos o estado intervir, melhores as condições para o crescimento.

No outro lado, existem os seguidores de John Maynard Keynes, que defende a plena atuação estatal. Keynes elaborou sua teoria nos anos 1930, durante a grande depressão pós 1929. Como, nessa época, havia alto nível de desemprego e o mercado, sozinho, parecia incapaz de solucionar os problemas econômicos, o estado se tornava o grande salvador: ao aumentar o gasto estatal, a renda aumentaria, alavancando o crescimento. Por muito tempo tal foi, exatamente, a receita seguida pelos governantes.

As duas teorias são igualmente válidas, sendo unicamente o desemprego - tanto de mão-de-obra quanto de capacidade produtiva - quem irá determinar a escolha de uma ou de outra. Em pleno emprego, a intervenção estatal gera um aumento na demanda por produtos e serviços que não pode ser acompanhada por um aumento na produção: temos inflação sem aumento de renda. No caso do desemprego de recursos, um maior gasto estatal torna mais eficiente o uso da capacidade instalada, aumentando a renda nacional.

Como, na maior parte do tempo, os países se encontram em um patamar intermediário entre pleno emprego e desemprego recessivo, a solução é conjunta. Os governantes devem estimular o uso e a expansão da capacidade produtiva (investindo, principalmente, em infra-estrutura) e intervir minimamente em mercados onde existe equilíbrio entre oferta e demanda.

Carpe Diem,


Tuesday, September 11, 2007

Oração de São Francisco

Senhor, Fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio que eu leve amor,
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão,
Onde houver discórdia, que eu leve a união,
Onde houver dúvida, que eu leve a fé,
Onde houver erro, que eu leve a verdade,
Onde houver desespero, que eu leve a esperança,
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria,
Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, Fazei que eu procure mais:
Consolar que ser consolado,
Compreender que ser compreendido,
Amar que ser amado.
Pois é dando que se recebe,
É perdoando que se é perdoado,
E é morrendo que se vive
Para a Vida Eterna

(Extraído de http://esoterico.terra.com.br/vidainterior/interna/0,,OI1079339-EI5930,00.html)

Longo Prazo

Dinheiro é um facilitador de trocas. Ao invés de trocar maças por TV, troca-se coisas por dinheiro. Mas dinheiro também é uma coisa. E troca-se dinheiro por dinheiro, no tempo.

Tudo que tem valor pode ser considerado capital (dinheiro), terra ou trabalho. A grande parte da população do planeta dispõe, basicamente, da oferta de sua mão-de-obra. Poucos podem usufruir de rendimentos por suas terras. Porém, uma boa parte pode se utilizar, ao menos em pequena escala, dos rendimentos de capital: os juros.

Uma vez com dinheiro (obtido pela venda de trabalho ou de outra forma) tem-se, em geral, duas opções: comprar ou poupar. Comprando, a pessoa obtem a utilidade de seu capital instantaneamente. Poupando, posterga-se a satisfação e, mais importante, abrem-se as portas para usufruir dos juros. Se dinheiro fosse banana, os juros seriam o preço da banana. Ou seja, deixando o seu dinheiro aplicado com juros, em algum tempo ele tende a valer proporcionalmente mais que no presente.

Dois problemas surgem: quanto poupar e como poupar. Na falta de uma bola de cristal, fica impossível saber se a utilidade (ou felicidade) de se gastar dez dinheiros agora é maior ou menor do que se gastar vinte dinheiros amanhã - uma conta que cada um, na sua particularidade, deve ser capaz de realizar. O como é, talvez, mais perturbador: sabendo que o melhor seria poupar, a tentação de gastar é ensurdecedora. Esse é o caso daqueles que somente conseguem poupar quando não existe o que poupar - pois já gastaram tudo. Talvez para esses, a infelicidade presente (ao se poupar) seja sempre infinitamente superior a qualquer felicidade futura.

Conhecendo a si mesmo, essas contas ficam cada vez mais fáceis e, com um pouco de treinamento, a utilidade de se gastar no futuro começa a render felicidade também no presente. O importante é nunca esquecer de computar o quanto vale o seu dinheiro: os juros!

Carpe Diem,

Monday, September 10, 2007

A Porta Estreita

Ela deu um pé na bunda dele!

E ele resolveu afogar as mágoas no bar. Encontrou alguns conhecidos e bebeu umas cervejas. De lá foi convidado para uma partida de poker e foi apresentado ao pó. No álcool, no jogo e nas drogas foi esquecendo seu antigo amor e encontrou paz. Hoje tenta se livrar dos vícios e tomar um rumo na vida. Tudo parece difícil e os prazeres que encontrava são cada vez mais vazios e sem sentido.

E ele sofreu a perda de seu amor. Ficou em casa alguns dias, cabisbaixo, e foi consolado por alguns amigos. Aos poucos procurou outras atividades que foram lhe dando prazeres cada vez maiores. Estudava, corria, praticava esportes e dedicava-se mais ao trabalho. Hoje está com diversas opções para dar rumo a sua vida.

A porta estreita é estreita apenas na entrada, depois torna-se um caminho amplo. A outra porta, ou a ausência de porta, parece larga no início, mas fica estreita logo-logo.

Carpe Diem,